Você já foi vítima de violência no ambiente escolar? Mesmo quem já passou por ele há muitos anos pode ter lembranças de agressões sofridas ou presenciadas nesta época, sejam elas físicas ou psicológicas.
Nas últimas décadas, uma palavra que teve origem na língua inglesa passou a ser mais conhecida nas escolas: o bullying. Ele caracteriza um tipo de violência intencional e repetitiva, que pode ser praticada por uma pessoa ou grupo e gera um desequilíbrio de poder entre essas partes envolvidas, conforme definido pela Lei nº 13.185/2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying).
Apesar de não ser um problema exclusivo das escolas, é nelas que o problema está mais concentrado. De acordo com a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Talis), cujos dados foram divulgados em 2019 pelo Inep, o ambiente escolar brasileiro é duas vezes mais suscetível ao bullying do que a média geral das instituições de ensino analisadas em 48 países. O estudo enfatiza ainda que as escolas brasileiras precisam de medidas mais enérgicas contra esse tipo de violência.
Outras pesquisas mais recentes, divulgadas em 2023, reforçam essa percepção. Segundo levantamento do Instituto DataSenado, quase 7 milhões de estudantes sofreram algum tipo de violência na escola, em um período de 12 meses. Já no 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 38% dos diretores de escolas consultados disseram que enfrentaram problemas com bullying.
A gravidade do tema fez os Estados-membros da UNESCO estabelecerem a primeira quinta-feira do mês de novembro como o Dia Internacional contra a Violência e o Bullying na Escola, englobando também o cyberbullying e reconhecendo que a violência escolar é uma forma de descumprimento dos direitos das crianças e dos adolescentes.
Quando o bullying mira no excesso de peso
Aproximadamente 85% dos brasileiros com obesidade relatam ter sofrido algum tipo de preconceito em relação ao peso, segundo levantamento realizado pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) e pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
Uma outra pesquisa com foco no estigma da obesidade, conduzida pela nutricionista e pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) Camila Secaf, apontou que mesmo os profissionais de saúde adotam condutas preconceituosas com frequência, por não olharem para a obesidade de forma mais ampla.
Camila também apresentou questionamentos sobre a utilização do Índice de Massa Corporal (IMC) como principal referência para diagnóstico e cuidado com a obesidade. Segundo a pesquisadora, são números úteis para estudos populacionais, mas que não trazem todas as informações necessárias, como composição corporal, relação com a comida e histórico de saúde. A falta de uma abordagem mais completa reafirma a gordofobia como um problema estrutural da sociedade.
Em 2023, a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) procurou a ABESO, em busca de um material educativo sobre o tema. A partir desta troca, foi lançado, em outubro de 2024, o guia “Obesidade infantil e bullying, um guia para pais e educadores”. O documento traz informações sobre a obesidade como fator de risco para o surgimento de condições crônicas de saúde, como o diabetes e a hipertensão precoce, e fala sobre o cenário atual do bullying no ambiente escolar. Além disso, orienta professores e familiares a terem um olhar atento para a violência relacionada ao excesso de peso, sugerindo conversas abertas e ambientes acolhedores.
O documento também aborda especificamente os desafios de crianças e jovens com obesidade durante as aulas de educação física e nas brincadeiras dos intervalos das aulas. Quando constrangidos ou discriminados, podem desistir da prática, o que contribui ainda mais para o aumento de peso, gerando um ciclo de isolamento e insegurança. Esse dilema intensifica problemas de saúde já existentes, provoca desinteresse pela escola, gera graves impactos emocionais e dificulta a busca por um estilo de vida mais saudável.
O bullying é uma violência que pode agravar a obesidade em crianças e adolescentes. Por isso, famílias, educadores e profissionais de saúde devem trabalhar juntos para promover a autoestima, o bem-estar e o respeito entre crianças e jovens, não só orientando na alimentação, mas oferecendo apoio emocional e incentivando atividades que valorizem as habilidades individuais.
Iniciativas multiprofissionais, como palestras, oficinas e campanhas realizadas em escolas e unidades de saúde também podem contribuir para o enfrentamento ao bullying. Como sempre lembramos aqui, a obesidade não é um problema individual, mas uma responsabilidade coletiva.
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